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terça-feira, 30 de dezembro de 2014

DIREITO À NOMEAÇÃO DE CANDIDATOS FORA DO NÚMERO DE VAGAS TEM REPERCUSSÃO GERAL


O Supremo Tribunal Federal (STF) analisará o direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados fora do número de vagas previstas no edital de concurso público no caso de surgimento de novas vagas durante o prazo de validade do certame. O Plenário Virtual da Corte reconheceu a existência de repercussão geral no Recurso Extraordinário (RE) 837311, interposto pelo Estado do Piauí contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça local (TJ-PI).
Na origem, trata-se de mandado de segurança impetrado por candidato que concorreu a vaga para o cargo de defensor público do Estado do Piauí. Conforme o acórdão questionado, a discricionariedade do poder público de nomear candidatos classificados fora do número previsto no edital deixa de existir a partir do momento em que a Administração pratica atos no intuito de preencher as vagas surgidas e demonstra expressamente a sua necessidade de pessoal.
Em decisão unânime, o TJ-PI entendeu que, se a Administração anuncia a realização de novo concurso dentro do prazo de validade do anterior e nomeia candidatos aprovados fora da ordem classificatória e do limite de vagas do edital, o ato de nomeação dos aprovados, mesmo que além do número inicialmente previsto, deixa de ser discricionário para tornar-se vinculado, convertendo-se a mera expectativa em direito líquido e certo.
No recurso extraordinário apresentado ao Supremo, o Estado do Piauí sustenta que o acórdão do TJ local violou os artigos 2º; 5º, inciso LV; 37, incisos III e IV, da Constituição Federal. Alega que a decisão atacada seria nula, pois teria determinado a nomeação e posse de candidatos aprovados fora do número de vagas oferecidos no edital do concurso público para provimento de cargos de defensor público estadual, sem comprovação de ter havido preterição.
Manifestação
O relator do processo, ministro Luiz Fux, observou que a discussão tem sido decidida de forma divergente pelas duas Turmas do Supremo. Por isso, ele destacou a importância do pronunciamento do Plenário sobre o tema, a fim de que seja fixada tese, “de modo a assegurar a segurança e a previsibilidade necessárias nos inúmeros certames públicos tanto para a Administração Pública quanto para os candidatos aprovados”.
Para o ministro Luiz Fux, as questões relativas aos concursos públicos são recorrentes “e indicam a relevância da controvérsia travada nos autos, que, de longe, supera os estreitos limites desta lide”. Assim, o relator considerou a existência da repercussão geral da questão constitucional suscitada, manifestação que foi acompanhada, por unânime, em análise realizada por meio do Plenário Virtual.

AS 15 COISAS MAIS COBRADAS NA PROVA DA OAB


Veja quais os principais temas que são cobrados:


  • 1- Direito Constitucional
Os temas de direito constitucional são muito importante, são só porque a FGV gosta de deles, mas porque são a base para entender os outros ramos do direito. Vale a pena se dedicar um pouco mais, principalmente para estudar os direitos e garantias fundamentais, a estrutura dos poderes, o processo legislativo, o controle de constitucionalidade.
  • 2 – Direito Civil
Direito Civil é sem dúvida onde se concentra a maior parte de todo o conteúdo, principalmente em virtude da sua subdivisão, então vale a pena se dedicar um pouco mais e dedicar um pouco mais de tempo.
Os principais temas que merecem atenção são: teoria do ato, fato e negócio jurídico, prescrição e decadência, obrigações, contratos, direitos reais e família.
  • 3 – Direito Processual Civil
O processo civil, apesar de parecer grande, não é tão enorme quanto é o direito civil, e você deve reestudar as partes que tratam as partes e dos procuradores, dos órgãos judiciais e dos auxiliares da justiça, do procedimento ordinário, dos recursos (ordinário, agravo de instrumento, especial e extraordinário) e das diversas espécies de execução.
  • 4 – Direito Penal
Direito Penal também é uma das principais disciplinas e não se deixe assustar por ser bastante subdividido, quando começar a estudar vai perceber que rende rápido. Assim, podemos começar pelos princípios e seguir com a tipicidade, a tentativa, desistência voluntária e arrependimento eficaz, as penas, a extinção de punibilidade, os crimes contra a pessoa, os crimes contra o patrimônio, os crimes contra a administração, os crimes hediondos e a lei de execução penal.
  • 5 – Direito Processual Penal
No processo penal deve-se estudar a ação civil ex delito, o inquérito penal, o procedimento do júri, a jurisdição e competência e a prova.
  • 6 – Direito do Trabalho
No direito do trabalho é importante rever o contrato de trabalho: modalidades, formalidades, alteração, suspensão e interrupção, a questão do salário e remuneração, a duração do trabalho, férias e repouso semanal, a insalubridade e periculosidade, o FGTS e estabilidade e a extinção do contrato de trabalho.
  • 7 – Direito Processual do Trabalho
Por sua vez, no Direito Processual do Trabalho, os principais temas são os princípios processuais, a organização da justiça do trabalho, as fase de conhecimento em dissídios individuais, os recursos: tempestividade, custas, embargos de declaração, recurso de revista e a questão da execução: agravo de petição.
  • 8 – Direito Tributário
Já no Direito Tributário, deve-se estudar o sistema tributário nacional, as limitações constitucionais ao poder de tributar, a competência tributária, a obrigação tributária, a responsabilidade tributária, os tributos em espécie e a administração tributária.
  • 9 – Direito Administrativo
No Direito Administrativo estude a organização da administração pública, os atos administrativos, os contratos administrativos, os agentes públicos e a intervenção do Estado na propriedade.
  • 10 – Direito Empresarial
Em direito empresarial não há muito para onde correr, devendo estudar a propriedade industrial e nome empresarial, o direito societário, principalmente as sociedades limitadas, anônimas e a nova EIRELI, os títulos de crédito e a falência e recuperação judicial e extrajudicial.
  • 11 – Direito do Consumidor
No direito do consumidor, cabe uma olhada na responsabilidade na prestação de serviços, na proteção contratual do consumidor e na defesa em juízo do consumidor, principalmente a questão do direito difusos e coletivos.
  • 12 – Direito da Infância e Adolescência
Alguns juristas não consideram os direitos da Infância e Adolescência como um ramo autônomo do direito, mas fato é que é cobrado na prova da OAB e é importante estudá-lo, principalmente o Estatuto da Criança e do Adolescente, a questão da família substituta, o ato infracional, e a medida socioeducativa.
  • 13 – Direito Ambiental
No direito ambiental estude a sua parte constitucional, os princípios de direito ambiental, o licenciamento ambiental e a responsabilidade por dano ambiental.
  • 14 – Direito Internacional Público
Já no direito internacional público, não deixe de verificar os sujeitos, as relações entre os estados, os tratados internacionais e a competência internacional e arbitragem.
  • 15 – Ética Profissional
A disciplina da ética profissional é a última coisa a ser estudada, de preferência na semana da prova da OAB, pois o que é cobrado é muito mais a letra fria da lei do que a compreensão sobre o assunto, como ocorre nos outros temas. E sobre ele verifique o exercício da advocacia, os direitos do advogado, os impedimentos e incompatibilidades, os honorários advocatícios, as infrações disciplinares e o processo disciplinar.
Um bom jeito de estudar todos esses temas para o Exame de Ordem é através de resumos, por dois motivos: 1) você já sabe o assunto, então é só relembrar; e 2) não há mais tempo de ler livro livros conceituais.

DESEMBARGADORA ENSINA PORTUGUÊS A ADVOGADOS E PEDE QUE COMPREM LIVROS COM URGÊNCIA


Erros de língua portuguesa nunca são bem recepcionados, é verdade. No entanto, quem é profissional do direito é especialmente exigente com relação a isso. E com razão: saber lidar bem com a sua língua é o pressuposto (básico) para qualquer argumentação.
Todavia, devido ao ensino deficiente nas faculdades de direito, não é muito difícil localizar erros grotescos na prática forense.
Durante o julgamento de um recurso, ao se deparar com vários erros de português, a desembargadora Sirley Abreu Biondi do TJ/RJ não se omitiu: "Insta ser salientado que os advogados que assinaram as contra-razões necessitam com urgência adquirir livros de português de modo a evitar as expressões que podem ser consideradas como injuriosas ao vernáculo".
A peça continha erros claros de ortografia, como: "em fasse", "não aciste razão", "doutros julgadores" e "cliteriosamente", devidamente sinalizados e corrigidos pela magistrada.
A desembargadora não parou por aí e prosseguiu com a lição, mas dessa vez sobre o conteúdo jurídico da peça: "acrescenta-se ainda que devem os causídicos adquirir também livros de direito, à medida que nas contra-razões constam 'pedidos' como se apelação fosse, o que não tem o menor cabimento".
Mesmo depois de uma boa aula, os advogados não se deram muito bem: a magistrada negou provimento ao recurso.
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Essa figura acima é a página final da sentença da Desembargadora Sirley Abreu Biondi, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Vejamos o que disse a Desembargadora:
“Insta ser salientado que os advogados que assinaram as contra-razões necessitam com urgência adquirir livros de português de modo a evitar as expressões que podem ser consideradas como injuriosas ao vernáculo, tais como “em fasse” (no lugar de “em face”), “não aciste razão” (assiste), “cliteriosamente” (criteriosamente), “doutros julgadores” (doutos), “estranhesa” (estranheza), “discusão” (discussão), inedoneos” (inidôneos)… Acrescenta-se, ainda, que devem os causídicos adquirir também livros de direito, à medida que nas contra-razões constam “pedidos” como se apelação fosse, o que não tem o menor cabimento”.
Segundo o Conselheiro Federal da OAB, Leonardo Acioly, “o advogado que atenta contra o vernáculo comete infração disciplinar : Art 43, Inc XXIV da lei 8906/94. É punível com suspensão que perdura até que o advogado preste novo exame da OAB.”

E ainda tem gente que reclama da prova da OAB.

STF DETERMINA FIXAÇÃO DE REGIME DE PENA DE FORMA FUNDAMENTADA PARA DETENTA


O presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, concedeu HC de ofício a uma detenta para que o juízo responsável avalie se estão preenchidos os requisitos para progressão de regime, bem como que seja fundamentada eventual fixação de regime mais gravoso de cumprimento de pena. Ela foi presa pela suposta prática dos crimes de tráfico de entorpecentes e associação para o tráfico.
Consta dos autos que a presa estava grávida quando foi impetrado um HC solicitando a revogação da prisão preventiva ou, subsidiariamente, que a prisão fosse convertida para domiciliar. A liminar foi indeferida e ela teve o bebê presa, em outubro de 2013, na Penitenciária Feminina de Tupi Paulista. O pedido também foi negado pelo TJ/SP e pelo STJ.
A Defensoria Pública do Estado alega que a criança já tem um ano e um mês de vida, na iminência de ser separada da mãe, e sustenta que, mesmo que se entenda pela idoneidade da manutenção da prisão preventiva, a prisão domiciliar deveria ser atendida "uma vez que, tanto a manutenção de mãe e bebê no ambiente prisional, quanto a separação entre mãe e bebê em tenra idade afrontam a razoabilidade e a dignidade da pessoa humana".
Regime mais gravoso
Em sua decisão, o ministro observou que a determinação questionada foi proferida monocraticamente. "Desse modo, o pleito não pode ser conhecido, sob pena de indevida supressão de instância e de extravasamento dos limites de competência do STF descritos no artigo 102 da Constituição Federal."
O presidente da Corte, entretanto, verificou que o caso é de concessão da ordem de ofício porque em setembro de 2014 foi prolatada a sentença que a condenou a uma pena total de três anos, dez meses e vinte dias de reclusão, cuja fixação do regime inicial de cumprimento de pena foi aplicada com imposição do regime mais severo baseado no artigo 2º, parágrafo 1º, da lei 8.072/90 - dispositivo declarado inconstitucional pelo plenário do STF, em 2012.
"Vale destacar que este Tribunal sedimentou entendimento no sentido de ser possível a imposição de regime mais gravoso do que o previsto para o quantum de pena aplicado, desde que tal decisão seja devidamente fundamentada", ressaltou o ministro, ao lembrar que essa orientação está fixada na súmula 719, do STF.
Para o ministro, ainda que seja o caso de aplicação do regime inicial fechado, a mulher está presa desde 28 de abril de 2013 e, portanto, já cumpriu mais de dois quintos da pena, "fazendo jus à análise de possível progressão de regime".

Fonte: STF

CF RECEBE MAIOR NÚMERO DE EMENDAS EM UM ANO


Em 2014, a Constituição brasileira foi alterada oito vezes pelo Congresso nacional: as emendas de número 77 a 84 passaram a fazer parte da Carta Magna.
Este foi o ano em que houve maior número de alterações na CF, desde que ela foi promulgada, em 1988.
Confira a ementa das alterações:

Emenda 77 - Altera os incisos II, III e VIII do § 3º do art. 142 da Constituição Federal, para estender aos profissionais de saúde das Forças Armadas a possibilidade de cumulação de cargo a que se refere o art. 37, inciso XVI, alínea "c".
Emenda 78 - Acrescenta art. 54-A ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para dispor sobre indenização devida aos seringueiros de que trata o art. 54 desse Ato.
Emenda 79 - Altera o art. 31 da Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998, para prever a inclusão, em quadro em extinção da Administração Federal, de servidores e policiais militares admitidos pelos Estados do Amapá e de Roraima, na fase de instalação dessas unidades federadas, e dá outras providências.
Emenda 80 - Altera o Capítulo IV - Das Funções Essenciais à Justiça, do Título IV - Da Organização dos Poderes, e acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal.
Emenda 81 - Dá nova redação ao art. 243 da Constituição Federal.
Emenda 82 - Inclui o § 10 ao art. 144 da Constituição Federal, para disciplinar a segurança viária no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Emenda 83 - Acrescenta o art. 92-A ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT.
Emenda 84 - Altera o art. 159 da Constituição Federal para aumentar a entrega de recursos pela União para o Fundo de Participação dos Municípios.

ATRASO NA ENTREGA DE COMPRA PELA INTERNET NÃO GERA DEVER DE INDENIZAR


A 4ª Turma Recursal Cível do RS considerou improcedente o pedido de indenização por danos morais a consumidora que não recebeu produto comprado pela internet no tempo prometido pela empresa. A decisão determinou a entrega do produto sob pena de multa diária.
A autora adquiriu um aparelho celular de uma empresa, pela internet, em 7/12/2013, com entrega prevista para 16 dias. Entretanto, o produto não chegou na data informada, ficando o autor sem o seu presente de Natal. Requereu o produto adquirido ou outro com a mesma qualidade e características ou, ainda, a restituição do valor pago, bem com indenização por danos morais no valor de R$ 4 mil.
No JEC da comarca de Canoas, a empresa foi condenada a entregar o aparelho à autora. A indenização por danos morais foi negada e a autora recorreu da decisão.
Recurso
A juíza de Direito Glaucia Dipp Dreher, da 4ª Turma Recursal Cível, manteve a sentença. Segundo a magistrada, a situação não foi grave e prejudicial o suficiente para determinar a indenização por danos morais.
As Turmas Recursais Cíveis têm decidido reiteradamente no sentido de que o mero descumprimento contratual não motiva indenização por prejuízo moral. O dano moral resta configurado somente em situações de extremo abalo emocional ou psíquico e, no caso em discussão, considera-se que a situação vivenciada pela autora não é intensa o suficiente a ponto de ultrapassar a esfera patrimonial, afirmou a magistrada.
Os juízes de Direito Léo Romi Pilau Júnior e Gisele Anne Vieira de Azambuja acompanharam o voto da relatora.
Leia o acórdão na íntegra.

  • Processo Relacionado: 71004977476

USAR PRISÃO PREVENTIVA COMO FORMA DE COAÇÃO É AFRONTA AO DIREITO


Por  e 
A dualidade Direito e Justiça sempre ocupou a agenda dos juristas. De toda forma, é consenso que nenhuma sociedade pode prescindir do Direito quando busca uma convivência justa. Repugna, pois, à consciência jurídica toda e qualquer orientação fundada na tese de que os fins definem os meios. Ao contrário, no plano do Direito, os meios definem os fins possíveis, sob pena de incorrermos na arbitrariedade.
É a partir dessa postulação que se compreendem muitas das soluções jurídicas para os diferentes problemas da vida. Assim é, por exemplo, o tema das provas ilícitas.
Jamais se admitirá uma prova cuja produção tenha desbordado dos limites da lei. Essa é a dicção da Constituição Federal, isto é: a compreensão do princípio da verdade real, que orienta a busca de verdade material, sem a qual não se faz justiça, pressupõe, no entanto, que a produção da prova seja feita dentro dos mais estritos limites legais, sob pena de nulidade.
Nada justificará a desconsideração dos direitos e garantias da pessoa humana, mesmo que a pretexto da busca da verdade material. Paradoxalmente, estamos vivendo uma quadra da história nacional em que essa verdade tem sido sacrificada em prol de outras exigências.
Com efeito, na semana passada, um dos membros do Ministério Público Federal observou em parecer lançado nos autos de um processo de Habeas Corpus que a prisão preventiva, justificada pela necessidade de preservação da ordem pública e conveniência da instrução probatória, também possuiria "a importante função de convencer os infratores a colaborar com o desvendamento dos ilícitos penais".
O que já estava se tornando de domínio público, isto é, a utilização da prisão como meio coercitivo de obtenção de confissão ou mesmo delação, agora resta absolutamente comprovado. Às favas com o Direito. O que importa é a confissão do investigado.
Nada mais ignominioso. A busca pela verdade, objetivo último de qualquer investigação, somente será legítima se forem observados os limites legais. Do contrário, ter-se-á a produção de uma prova ilícita, nula, imprestável para fundamentar qualquer processo judicial.
Pensar que se possa utilizar a prisão preventiva como meio de coação sobre o investigado, para constrangê-lo a confessar ilícitos que tenha supostamente praticado, significa uma afronta ao Direito.
É fazer sobrepor a razão do Estado à razão jurídica, quando, na realidade, a grande conquista da modernidade foi estabelecer o primado do governo de leis sobre a arbitrariedade do governo de homens.
Não se faz justiça ao arrepio do Direito. A sociedade brasileira ainda tem na sua memória os tempos de autoritarismo, em que as garantias constitucionais não passavam de formalidade.
A prevalecer a opinião do procurador, para quem a segregação na forma da prisão preventiva encontra-se igualmente justificada quando se cuida da "possibilidade real de o infrator colaborar com a apuração da infração penal, como se tem observado ultimamente", teremos violentado o Direito, a ética e a própria necessidade de o ser humano viver de forma justa.
A prevalecer, mais uma vez, essa esdrúxula posição, estaremos, na prática, institucionalizando a tortura psicológica quando se cuidar de buscar a verdade material.
Urge, pois, que o Judiciário recupere o sentido das coisas. Não podemos aceitar retrocessos na evolução institucional do país.

NOVA CHANCE: CONDENADOS POR HOMICÍDIO E TRÁFICO, EX-PRESIDIÁRIOS TRABALHAM NO STF


“Marcelo é um funcionário aplicado e integrado ao gabinete”, elogia o ministro Gilmar Mendes à coluna Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo. Ele se referia a Marcelo Guedes, um dos cinco ex-presidiários que trabalham em seu gabinete. Condenado em 2007 a oito anos de prisão por tráfico de drogas, Marcelo ficou preso por um ano na Papuda, em Brasília, de onde saiu por um Habeas Corpus. Inscreveu-se então num programa que oferece trabalho no STF a pessoas que cumprem pena em regime aberto ou semiaberto.
Junto com ele trabalham Wellington Almeida, Valdir de Oliveira e Robson William, conforme relata a coluna na edição do último domingo (28/12). O primeiro foi condenado a 11 anos depois de matar uma pessoa em 2011. Ele já cumpriu um sexto da pena e hoje está no semiaberto, por isso volta todos os dias para dormir no CPP, o Centro de Progressão Penitenciária de Brasília. O segundo, ex-policial, matou uma pessoa em 2002 e foi condenado a 12 anos. Ele já está no regime aberto. Já Robson foi condenado por assalto e trabalha no STF há um ano. Todos recebem R$ 1.200 mensais.
"O ministro Gilmar Mendes [foto] aceita traficante, homicida, assaltante. Ele não tem preconceito", diz Robson. O ministro diz que nem sequer pergunta aos coordenadores do programa o crime que eles cometeram. "Eu não poderia entrar nessa discussão sob pena de projetar preconceito e de negar chance às pessoas, comprometendo o próprio intento do programa", diz o magistrado, que lançou a iniciativa em 2008, quando presidia o Supremo. 
"Quando aparece alguém querendo ajudar, como aqui no STF, você até eleva a cabeça. Eu agora quero estudar. Para bater no peito e dizer 'eu posso!'", afirma Robson,que faz planos para atuar como advogado de defesa, na área criminal.
Carlos Eduardo Estevam já terminou há dois anos de cumprir pena por tráfico de drogas. Ganhou emprego fixo: integra a equipe de secretários do gabinete de Gilmar Mendes.

JUSTIÇA GRATUITA: RECURSO BOM É RECURSO MORTO: É ASSIM QUE PENSAM OS TRIBUNAIS?


Por  e 
De uns tempos para cá, o Superior Tribunal de Justiça vem fincando pé em entendimento cujo desígnio é, uma vez mais, obstar o exame de mérito dos recursos especiais, a ponto de robustecer seu extenso rol de jurisprudências defensivas que, no conjunto, fragilizam sobremodo o acesso à justiça emterrae brasilis. A lei, em grande parte das vezes, é jogada a um exílio epistêmico. A motivação? Utilitarista, é claro. E tudo em nome de efetividades quantitativas, com o sacrifício das efetividades qualitativas.
Pois bem. O mais novo integrante dessa relação é a exigência imposta aos beneficiários da justiça gratuita de renovarem o pedido que lhes ensejou a benesse legal quando do manejo do recurso especial, uma vez que, segundo o STJ, o deferimento anterior não alcançaria automaticamente as interposições posteriores. Não elaborando o recorrente, no momento da interposição, pedido de extensão da benesse para a instância recursal, a consequência tem sido a negativa de seguimento do recurso pelo não atendimento da exigência contida no art. 511, caput, do CPC (nesse sentido: EDcl no AgRg nos EAREsp 221.303/RS, Corte Especial, Rel. Ministro Sidnei Beneti, DJe de 27/3/2014; AgRg nos EDcl no AREsp 497.645/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 15/08/2014; e EDcl no AREsp 399.852/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 7/2/2014; AgRg nos EAREsp 321.732/RS, Corte Especial, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 23/10/2013).[1] Surge, pois, requisito de admissibilidade recursal que tem surpreendido muitos advogados Brasil afora.
Como já se referiu linhas atrás, esse posicionamento realmente fere de morte o sistema normativo. Afinal, a Constituição reza que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” (CF/88, artigo 5º, LXXIV). Em reforço, a Lei 1.060/50, em seu artigo 9º, prevê que “os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as instâncias.” E como se não bastasse, é nada menos que ululante a ofensa que enseja ao próprio Regimento Interno do STJ, no qual se lê que“prevalecerá no Tribunal a assistência judiciária já concedida em outra instância” (RISTJ, artigo 115, parágrafo 2º). Como é de conhecimento geral, a assistência judiciaria compreende, entre outros, isenções relativas às taxas judiciarias, aos emolumentos e às custas (Lei 1.060/50, artigo 3º). Não encontramos, depois de muita procura, em nenhum dos textos legais, limitação temporal à gratuidade da justiça ou exigência de renovação do pedido que suscitou seu deferimento. Nadinha de nada.
A inconstitucionalidade da posição do STJ é evidente, já que o posicionamento adotado sobrepuja o direito fundamental à assistência judiciária plena, oponível aos integrantes do Judiciário e que os sujeitam a conhecer, processar e julgar causas e recursos que se encontram no âmbito da sua competência. Segundo a Constituição, basta para que o Estado preste assistência jurídica (integral e gratuita) a comprovação, por parte do interessado, da condição de miserabilidade na qual se encontra. É esse o único requisito determinado pelo constituinte por intermédio de uma cláusula pétrea, não cabendo a ninguém, muito menos aos julgadores, incrementar o texto normativo para nele inserir outras exigências.
E a legislação infraconstitucional, nesse mesmo rumo, é respeitosa à vontade da Constituição porque deixa claro que a assistência judiciária vale para todos os atos processuais, até a decisão final do litígio e envolve todas as instâncias. Desponta daí o equívoco hermenêutico, pois a vindicação de reiteração da justiça gratuita para que recursos especiais sejam conhecidos desdenha que também o legislador (e não poderia ser diferente) largueou os benefícios da assistência judiciária não a um ou a outro ato processual, mas a todos eles, até a decisão final do litígio, englobadas todas as instâncias.
Parece indubitável que, aqui, o Tribunal da Cidadania resolveu legislar. Decidiu criar direito novo, ausente motivação que autorize a não aplicação das leis que regem a matéria. É o que chamamos de ativismo judicial, praticado justamente pela Corte cuja missão é zelar pela uniformidade de interpretações da legislação federal. Textos jurídicos devem nos importar. Textos jurídicos possuem limites semânticos. E o nosso valoroso e estimado STJ extrapolou-os. Não é porque nós estamos dizendo. É porque é e tem sido assim. É como se Kelsen tivesse razão ao dizer que a interpretação feita pelo judiciário é um ato de vontade.
De todo modo, se há alguma coisa de boa nisso tudo é que, ao menos, a circunstância serve para ilustrar e enaltecer pontos importantes e necessários previstos no novo CPC. É que a futura legislação processual traz consigo, numa série de artigos, compromisso de combate à jurisprudência defensiva. Seria suficiente afirmar que essa equivocada prática adotada pelos tribunais brasileiros (é isso mesmo: o efeito cascata já está ocorrendo e o exemplo vem sendo seguido pelos tribunais regionais) para desafogar as pautas de julgamentos não encontra respaldo num sistema processual em que as partes têm a seu favor um contraditório como direito de influência e não surpresa (CPC Projetado, art. 10). Mas a novel lei vai além e autoriza, dentre outras barreiras, tanto o STF como o STJ a desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave (artigo 1.026, parágrafo 3º). O dispositivo, é bem verdade, poderia ter adotado posição mais dura, sem timidez, até para evitar as os dribles hermenêuticos com as quais frequentemente se depara. De qualquer modo, ponto para a doutrina!
É evidente que ninguém é inocente para crer que bastam legislações e boas intenções para salvar o mundo — entre nós há uma espécie de fetichismo da e com a lei. Daí a importância de que a doutrina volte a doutrinar,[2] para denunciar o desrespeito à lei.
De outro lado, acertou o novo CPC ao impor que os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. Já se tratou disso em outros textos (ler aqui),[3] mas nunca é demais insistir. Decerto que em um sistema processual, que preza pela integridade e coerência da jurisprudência, protagonismos judiciais como o indicado não encontrarão solo fértil.
Para resumir: hoje há um padrão decisório a justificar decisões negando seguimento a recursos especiais pela ausência de reiteração do pedido de justiça gratuita. Mas o importante é notar que essa “coerência no erro” não se sustenta em face da integridade. Não se pode confiar sentidos às coisas segundo entendimentos pessoais do intérprete porque o mundo a ninguém pertence: nele nos situamos a partir de uma intersubjetividade. Não há um grau zero de sentido! No direito inexiste linguagem privada e, por isso, é insuficiente adotar padrão coerente de decisões se o que se faz está pautado no equívoco. Quer-se com isso, enfim, deixar claro que, se necessário, a coerência resigna-se em favor da integridade, e no que tange ao problema aqui abordado não há dúvida de que os textos legais apontados ao longo desse ensaio, com seus evidentes limites semânticos, desautorizam o modo de decidir do Egrégio STJ ao criar esse requisito contra legem de admissibilidade recursal.
Havendo, pois, um direito fundamental à resposta adequada à Constituição, é o que basta para que a cadeia equivocada seja rompida e prevaleça a tese oposta de que, uma vez deferida e demonstrada a concessão do benefício nas instâncias ordinárias, e não havendo comprovação de que tenha decaído do direito à gratuidade, desnecessária a renovação do pedido, porquanto a concessão da justiça gratuita abrange todos os atos do processo, inclusive nas instâncias superiores.
E não se diga que a integridade é exigência apenas a partir de agora, porque prevista formalmente apenas no novo CPC. Desde há muito autores como Dworkin e McCormick e no Brasil, por todos, o co-autor destas reflexões Lenio Streck (Verdade e Consenso e Comentários a Constituição do Brasil, parte introdutória denominada Princípios da Interpretação Constitucional) sustentam que a integridade é um princípio vinculante de aplicação do direito.
Não fosse pela integridade, seria pela obediência dos limites semântico-hermenêuticos da lei. E da Constituição.

[1] Por todos, cite-se o seguinte julgado: “Agravo regimental nos embargos de divergência. Ausência de comprovação do recolhimento das custas no ato de interposição do recurso. Beneficiário da justiça gratuita. Ausência de pedido na petição de recurso. Deserção. Incidência do art. 511 do Código de Processo Civil. Recurso a que se nega provimento. 1. O preparo deve ser feito no momento da interposição do recurso, sob pena de deserção, sendo certo, outrossim, que na hipótese de o recorrente ser beneficiário da justiça gratuita, deve haver a renovação do pedido quando do manejo do recurso, uma vez que o deferimento anterior da benesse não alcança automaticamente as interposições posteriores. Precedente desta Corte. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg nos EAREsp 321.732/RS, Corte Especial, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 23/10/2013).
[2] Frase cunhada de há muito por um dos signatários deste artigo, Lenio Streck.
[3] STRECK, Lenio Luiz. Novo CPC terá mecanismos para combater decisionismos e arbitrariedades? Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2014-dez-18/senso-incomum-cpc-mecanismos-combater-decisionismos-arbitrariedades>.

O FUTURO DO DIREITO COMO DIREITO FRATERNO


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Chegamos aos últimos dias de 2014. O ano de 2015 já se anuncia como difícil, mas também cheio de desafios e esperanças. Pensei que era melhor falar do futuro. Do futuro e do direito. A ideia de fraternidade me veio à mente. Não é possível falar do futuro e do direito sem fraternidade. Não é possível falar em futuro da humanidade sem fraternidade.
Lembrando dos belos momentos compartilhados com os amigos do Grupo Cainã em encontro capitaneado pelos professores Jacinto Coutinho e Avelãs Nunes em Coimbra (2008), resgatei o texto base da coletânea resultante daqueles debates[1] para, mais uma vez, homenagear o professor Eligio Resta, grande jusfilósofo italiano com quem muito aprendi durante o período de orientação no estágio doutoral naUniversità degli Studi di Roma Tre.
Pensador dos paradoxos, Resta enfrenta os temas sempre em chave ambiguidade e reciprocidade[2]. Possui uma leitura com alguma tinta liberal do fenômeno jurídico (em diversos momentos deixa claro sua posição contrária à intervenção excessiva do Direito) e frequentemente recorre a conceitos do funcionalismo luhmanniano para descrever o sistema jurídico, entendido como uma ordem substitutiva da Justiça e fruto da redução da complexidade social[3]
Filósofo consciente das dificuldades do voluntarismo e da profundidade das categorias com as quais trabalha, por diversas vezes não hesita em dar uma resposta ambígua e humilde aos questionamentos: “O que podemos fazer? Podemos fazer tudo o que podemos fazer” ou então, “É uma aposta que vencerá quando vencerá”[4]Mas depois, investigando as origens das instituições e enfrentando o âmago dos temas tratados, mostra os caminhos a seguir.
Superando pré-conceitos ingênuos ou ecumênicos, Resta indica que o futuro do direito deve se dar enquanto direito fraterno, no qual a fraternidade recusa toda a hipocrisia e é entendida como a “consciência de dever de distanciar-se da lógica da inimizade e condividir espaços comuns com cada outro indivíduo, com sua vida, história e dignidade”.
Para melhor compreender sua proposta, a coluna de hoje é um convite ao jusfilosofar livre, um exercício diferente para pensar as possibilidades futuras do direito.    
Ambiguidade do direito
Em um mundo tão intolerante, Resta sustenta que definições maniqueístas do tipo bom/mau, justo/injusto são diferenciações que não se sustentam do ponto de vista social porque “a sociedade produz simultaneamente um e outro e um porque outro, uma coisa porque outra. Assim produz a ‘doença’ e seu remédio."
Ele resgata o conceito platônico de pharmakon como símbolo máximo da ambivalência, que, não por acaso, ligava a lei e a violência:
 O pharmakon era exatamente este jogo de oscilação que indicava no mesmo tempo veneno e seu antídoto, a cura e a doença, mas também a vítima e seu carrasco. O veneno tomado em dose justa se transformava em antídoto, mas ao mesmo tempo continuava a pertencer à natureza de veneno: aquilo que era a doença se tornava a cura, se invertesse um momento depois na cura que se transformava em doença. Uma não era dissociada da outra. A violência é a cura da violência. Assim, a lei deveria ameaçar e usar a violência para combater a violência; quem usava a violência era passível de uma outra violência, então o algoz se transforma em vítima[6].
A imunização viria através da correta aplicação do veneno, cujo diagnóstico histórico aponta para três grandes modelos de solução utilizados socialmente:
i)              dação ao sacrifício;
ii)             vingança (faida), duelo, guerra e;
iii)         fria violência administrada monopolisticamente por um aparato judiciário burocrático.
Este último somente se realiza com a construção do Estado que, por meio de seu aparato de soberania, monopoliza a violência e confia a um terceiro, o juiz, a última palavra sobre a violência.
Assim, para que haja a imunização, o direito moderno invoca a legalidade na tentativa de evitar todo excesso inútil de pena: a aplicação da justa dose do veneno deve ser prevista e enunciada. Daí a possibilidade de condenação ser definida em lei e a violência contar com a contabilidade administrativa de um juiz que, ao julgar, evita que ela se propague.
Segundo Resta, nesse jogo de oscilação reside toda a ambiguidade do direito:
i)              É uma técnica violenta que visa enganar a violência;
ii)          É técnica que tem por função impor limites à própria técnica, ex. bioética, matérias relacionadas ao meio ambiente[7].
Ele se torna potência (impõe um dever-ser que muitas vezes faz valer aquilo que na realidade não podemos fazer) e também remédio para uma sociedade que, doente, precisa de respostas para seus problemas.
Além de fármaco, o aparato tecnológico do direito, enquanto um sistema complexo, constitui o que ele chama de uma macchina non banale: a decisão não acontece numa relação de estímulos singulares que produzem respostas imediatas. Ele é decisão sobre uma decisão anterior (a do legislador, que, ao elaborar a lei, faz uma escolha e reduz a complexidade sistêmica no meio ambiente social), mediada por uma série de discursos produzidos em seu interior e inúmeras regras procedimentais[8].
A partir dessas constatações e, num contexto onde não cabem explicações de matriz jusnaturalista nem juspositivista, Resta se propõe a pensar uma forma não violenta de realização do Direito que, além de superar os dogmas jurídicos da modernidade se legitime num ambiente axiologicamente pluralista e mundializado.
Para tanto, encontra no resgate da fraternidade, promessa esquecida da Revolução Iluminista, a base para a construção do novo direito.
Superação da modernidade jurídica
Na direção de um direito não violento, assentado no resgate da fraternidade enquanto um valor a ser juridicamente protegido e, mais do que isso, promovido, o primeiro obstáculo encontrado pelo professor italiano é o modelo de soberania estatal nacional. Segundo ele, desde uma leitura contratualista, os Estados soberanos (chamados lobos artificiais) protegem os direitos fundamentais, mas possuem um vício de origem[9].
Esse vício ocorre porque os direitos fundamentais são a afirmação histórica da fraternidade e frutos de ideais universalistas, mas apenas encontram abertura na prática política ligados a uma realidade imaginária, a do Estado Nação, conforme aparece disposto já no artigo 3º da Declaração de 1789.
Nessa leitura, a fraternidade enunciada de maneira fortemente atrelada à ideia de soberania apresenta um grande limite à condição fraterna dos povos, uma vez que  “terminava por assinalar um destino entregue ao internacionalismo mais que ao verdadeiro e próprio cosmopolitismo: aquele direito fraterno se proclamava universal mas tinha necessidade de estado e soberania”[10].
Pensando na realização de uma civitas maxima — isto é, uma comunidade política de cidadãos acima da cada estado — Resta compreende que a primeira condição necessária para que se possa falar de direitos fundamentais em chave universal é a remoção da ideia de soberania, tornando possível que se renuncie a nacionalismos/individualismos ilusórios, de modo que os direitos dos povos possam encontrar pertença e identidade.
Conclui, então, que a soberania é o principal obstáculo à universalização da fraternidade e ao pacifismo internacional, noção presente no escrito kantiano sobre a paz perpétua e também nos escritos do primeiro pós-guerra de Kelsen.
Em consequência, Resta pontua que o direito moderno — derivado da lógica da soberania — apresenta armadilhas que precisam ser desarmadas.
Por trás de categorias como sujeito de direito, direito subjetivo, lide e conflito, todos tutelados e/ou resolvidos pelo Estado Soberano, se esconde um código de igualdade assentado numa noção egoísta de cidadania, espécie de antropologia da inveja, na qual o direito se reduz à relação entre a pretensão de uma parte e a prestação superobrigatória de outra, onde seu objeto se resume a uma mera troca individualística.
Por isso, é necessário romper com essa tradição e resgatar alguns traços (rastros) apagados, tarefa que num primeiro momento demanda uma pesquisa da semântica histórica — na linha proposta por Koseleck — que traga à luz a riqueza multifacetada dos sentidos dos conceitos jurídicos, especialmente seus traços apagados pela tradição que trai.
E, na tradição jurídica da modernidade, o direito vencedor apagou o sentido mais essencial da solidariedade — o dever de todos, o communus da comunidade de garantir o direito do próximo — promovendo uma cidadania de bases individualistas.
Resta explica que esse sentido, ora apagado, estava presente no artigo 23 da Carta francesa de 1793, no qual se encontra a noção de que a luta pelo direito é um problema de cultura da comunidade, manifestada na previsão de que é dever de todos zelar pelo reconhecimento, manutenção e efetivação do direito de cada um. 
"Os direitos, entendidos como ‘plural absoluto’, deveriam se realizar como um problema comunitário e de reciprocidade positiva, pelo qual os direitos dos outros seriam reconhecidos apenas sob a condição de reconhecimento simétrico e em função da redução da violência recíproca, dentro de um pacto que não poderia exigir [admitir] uma soberania”[11].
Esse modelo, derrotado pela história, se opõe fortemente à antropologia negativa do contratualismo e à forma Leviatã, em que o estado se coloca como um terceiro apto a gerar segurança jurídica e paz entre homens que não conseguem resolver seus problemas.
Passados alguns séculos desde as grandes revoluções jurídicas da modernidade, o esfacelamento ético-moral da sociedade (quanto menos prevalece a ética social, mais o direito se torna necessário para estabilizar as relações e condutas humanas), a intolerância oriunda dos maniqueísmos e o excessivo apego ao judiciário como superego da sociedade  (afinal não conseguimos resolver pacificamente nem a guarda do nosso animal de estimação, tendo que recorrer ao juiz para que ele estabeleça a guarda cão-partilhada, como tem se tornado comum nas ações de divórcio) são sintomas evidentes de esgotamento do atual modelo.
E, para resolver esses problemas, de nada adiantam reformas processuais — logo o fórum estará congestionado de novo. Daí a atualidade da advertência do professor italiano: ou repensamos as relações jurídicas a partir de maior simetria e responsabilidade recíproca pelos nossos atos e pela guarda primária do direito do próximo, enquanto expressão maior da fraternidade, ou possivelmente, não haverá futuro para o direito. Em nome da Coluna, desejo um excelente 2015 a todos!
[1] MARRAFON, Marco Aurélio. A fraternidade como valor universal: breve diálogo com Eligio Resta sobre o futuro do direito.  In: AVELÃS NUNES, Antonio José. COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda (coords). O direito e o futuro, o futuro do direito. Coimbra: Almedina, 2008. p. 431-444.
[2] RESTA, Eligio. L’ambiguo diritto. Milano: Franco Angeli Editore, 1984, pp. 9-14.
[3] RESTA, Eligio. Le stelle e le masserizie: paradigmi dell’osservatore. Roma-Bari: Laterza, 1997p. 159.
[4] RESTA, Eligio. Poteri e diritti. Torino: G. Giappichelli Editore, 1996, p. 55.
[5] RESTA, Eligio. Il diritto fraterno. Roma-Bari: Laterza, 2006, p. VII.
[6] Ibidem, p. 100.
[7] RESTA, Eligio. Poteri e diritti. Op. cit., p. 55 e ss.
[8] RESTA, Eligio. Le stelle e le masserizie: paradigmi dell’osservatore. Op. cit., p. 182.
[9] RESTA, Eligio. Poteri e diritti. Op. cit., p. 22.
[10] Ibidemp. 18.
[11] Ibidem, p. 90-91.
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Olá, pessoal!!! Sou Paulo Daltro, atualmente Funcionário Público do Estado de Sergipe. Sou graduado em Gestão da Tecnologia da Informação e Graduando em Direito pela Faculdades AGES (Paripiranga/BA). Desde já, sejam todos bem-vindos ao “Eu Entendo Direito”. Abordaremos sobre os diversos ramos do Direito, com dicas, resumos, curiosidades e notícias... Abraço! Ubi non est justitia, ibi non potest esse jus.

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